Hoje fomos ao shopping, realizar as compras de Páscoa. Com
dois meninos pequenos, fizemos um esquema de divisão: enquanto meu marido
encarava as filas e escolhia os chocolates, coube a mim a missão de distrair as
duas ferinhas. Não foi nada difícil... Eu os levei à livraria e ficamos mais de
quarenta minutos sentados, lendo.
Não pude evitar de ter alguns flasbacks da minha infância e adolescência
com essa cena. Enquanto meus meninos desfilavam pelas prateleiras, escolhendo
concentradamente as histórias, lembrei-me da jovem Caroline, com seus doze ou
treze anos, passeando pelo shopping.
Eu curtia o cinema, assim como o famigerado Mc Lanche Feliz
(que agrada meus guris tanto quanto os livros). Também amava passear pelas
lojas e sonhar com objetos de consumo de vários tipos. Porém, no momento em que
eu entrava pelas portas da livraria, o tempo congelava. O restante não
importava mais. Nem coelhos, nem chocolate ou qualquer outra coisa. Era ali o
meu lugar.
Enquanto eu caminhava lenta e timidamente pelas prateleiras
de livros, meus olhos passeavam com rapidez pelos títulos e minhas mãos acariciavam
algumas capas, como se fossem feitas de algo precioso, que pudesse quebrar. Algumas
vezes, eu abria um ou outro livro apenas para sentir seu cheiro característico
e ler frases aleatórias, numa tentativa de emergir naquela história em um gesto
apenas.
Era impressionante o poder que os livros exerciam sobre mim.
Quando eu tinha uma história para ler, todo o restante do mundo simplesmente
desaparecia. Eu poderia ler no meio da livraria, com várias pessoas passando e
conversando ao meu redor. Nada importava. Eu estava dentro da história, nada
poderia me tirar dela. Era como se, ao abrir um livro e pousar meus olhos sobre
suas letras, uma nova dimensão se dispusesse diante de mim e eu adentrava por
ela, fechando a porta para o resto que ficou do outro lado.
Não importavam festas, encontros de amigos, reuniões
familiares. Aliás, todas essas coisas me eram enfadonhas e aborrecidas na fase
da adolescência. Talvez eu realmente tivesse um grau não diagnosticado de
autismo, onde meu ponto de equilíbrio para escapar da realidade tumultuada de
vozes, cores e estímulos, eram os livros.
O meu mundo. Onde eu podia deixar exacerbar toda a sensibilidade
que eu tinha dentro de mim, e que ninguém do lado de fora parecia conseguir
compreender. As letras, versos e palavras foram meu refúgio durante anos. Embora
hoje eu seja mais “incluída” socialmente, ainda é ali que me sinto em casa.
Quando estou lendo ou escrevendo, sou eu mesma. Fora disso, só quem consegue
mergulhar em minha essência pode me compreender. E acredite, são poucos...
Sou um verso em eterna construção num mundo em que poesia,
arte e sensibilidade não tem a menor importância. Sou uma linha espiral no meio
de formas retas e ângulos exatos. Ainda não me encaixo em lugar nenhum nessa sociedade...
Mas enquanto houver livros, vai estar tudo bem.